Terapia Online e privacidade em época de coronavírus

Mulher fazendo chamada de vídeo com um homem através de um smartphone

Neste período de crise provocada pela pandemia do covid-19, a quarentena foi um empurrão significativo para o aumento da oferta e procura de serviços de terapia online. Se a terapia era um serviço que acontecia primordialmente no modo presencial, recentemente inúmeros pacientes começaram a aderir ao atendimento online, devido aos protocolos de prevenção ao covid-19.

Contudo, para que a terapia online ocorra um quesito é indispensável: ter um espaço no qual a privacidade seja assegurada. Os pacientes que prontamente aderiram foram aqueles que tinham uma margem de privacidade em sua casa que permitia a realização de chamadas de vídeo sem serem interrompidos ou observados. Ou seja, são pessoas que moram sozinhas, ou que moram com pessoas que respeitam sua intimidade. Porém, e quando o cliente/paciente não possui essa privacidade em sua residência? Como lidar com esse obstáculo inicial para dar continuidade ou mesmo iniciar sua terapia?

Caracterização da terapia online

A terapia online possui a mesma metodologia da terapia presencial, mudando apenas o meio, pois é realizada através da internet. Nesse sentido, o atendimento é semelhante a um atendimento presencial, só que disponibilizado de modo online. Podemos com isso dizer que migrar para o online é adaptar o presencial entrando em um outro espaço de interações de uma mesma prática clínica que tradicionalmente teve início e se popularizou de modo presencial. E que notebooks, tablets, smartphones e seus respectivos aplicativos (Google Duo, WhatsApp, etc.) são as ferramentas tecnológicas que possibilitaram a transposição do atendimento presencial para o ambiente virtual, bem como a sua acessibilidade.

A recomendação de migrar o atendimento presencial para a terapia online

Seguindo orientações da Organização Mundial de Saúde (OMS) acerca da necessidade do isolamento social, o ofício-circular de 23/03/2020 do Conselho Federal de Psicologia (CFP) publicou uma recomendação para que atendimentos presenciais fizessem a migração para online, exceto atendimentos presenciais de urgência/emergência.

A partir dessa nota, a prioridade inicial para psicólogos foi organizar o serviço psicológico remoto, psicoterapia à distância, terapia online, sinônimos para a mesma atividade clínica realizada no ambiente da internet. Com isso, os atendimentos presenciais em curso nos consultórios de psicologia de todo Brasil se deparam com a necessidade de serem transpostos para o ambiente online. Em seguida veio a necessidade de segurança, como abordamos no texto anterior, Terapia online em uma base segura. Assim, entre os desafios enfrentados para essa transposição, o principal deles foi a falta de privacidade de pacientes em situação de isolamento.

O problema da privacidade no isolamento social

Neste cenário, o problema da privacidade se colocou para os pacientes: como conversar com meu psicólogo se eu não tenho um local adequado, silencioso, privado e separado de outras pessoas na minha casa?

Essa ausência de privacidade envolve a dificuldade de encontrar um ambiente calmo, tranquilo, sem interrupções, protegido da possibilidade de ser ouvido na sua intimidade. Migrar atendimentos do presencial para o online em uma situação de quarentena fez com que o cliente/paciente tenha que lidar com a ausência de uma privacidade em sua residência. Contudo, para que a terapia online possa acontecer, a privacidade precisa ser construída e protegida.

Terapia online e privacidade

Consultório presencial como ferramenta de privacidade

É importante ressaltar que a busca pela terapia online é anterior ao problema da pandemia, e que a pandemia apenas deu maior destaque, urgência e adesão. Fato é que no atendimento presencial não existe, em tese, o problema da privacidade para o cliente resolver, uma vez que ir a um consultório, que é uma sala fechada, é ter esse problema resolvido. Assim, podemos também dizer que um consultório é uma ferramenta de privacidade.

Explico-me. Para oferecer a terapia presencial o psicólogo precisa de um consultório, ou seja, uma sala montada, mobiliada e equipada. Para o online, o profissional precisa de uma ferramenta (desktop, notebook ou smartphone). Claro que podemos dizer que o sofá, a poltrona, a sala fechada do psicólogo formam o conjunto de suas ferramentas para o presencial, de tal maneira que um consultório de psicologia se mostra como um instrumento de privacidade. E por outro lado, seu smartphone ou notebook uma ferramenta para o online.

Entretanto, na terapia online o paciente não faz a terapia na sala do terapeuta, e isso não quer dizer que o paciente faça a terapia em qualquer lugar. A sala do terapeuta é um espaço preparado para possibilitar uma experiência de segurança e privacidade sem interrupções. E quando a quarentena implica numa recomendação de que o atendimento presencial em andamento seja transposto para o online, o paciente não pode contar com a segurança e privacidade do consultório do psicólogo. Ao mesmo tempo é verdadeiro que se o paciente não possui um local com privacidade e segurança para realizar suas sessões online, surge um obstáculo para a continuidade do seu tratamento.

Construindo um momento de privacidade dentro do isolamento

O que ocorre no isolamento social é que estamos numa situação onde a mobilidade é posta em questão. O confinamento coletivo em casa é a realidade. E em dinâmicas familiares disfuncionais onde já existia previamente a falta de privacidade, a quarentena acentua essa dificuldade. Se conversar com um psicólogo online exige do paciente organizar um momento de pausa em meio a seu cotidiano, surge o desafio de ter privacidade dentro de casa.

O problema de iniciar uma chamada de vídeo em sua residência e falar de sua intimidade veio sendo respondido de duas maneiras por pacientes que não possuem previamente uma privacidade assegurada: através de um posicionamento pessoal dentro de casa ou pela adoção de outras ferramentas evitando a chamada de vídeo.

Para alguns pacientes, criar um espaço de privacidade já é parte da sua terapia. São pacientes que assumem um posicionamento dentro da dinâmica familiar demarcando melhor os limites entre o eu e o outro. Conforme o tipo de dinâmica familiar, um posicionamento assertivo que demarque o limite entre mim e o outro já é suficiente para criar um momento de privacidade que permita realizar suas sessões online com tranquilidade.

Para outros pacientes com realidades familiares diferentes, tal posicionamento não rende o resultado necessário, e apenas confirma a dificuldade de ter uma margem de controle do ambiente onde se encontra, impossibilitada de criar um momento de privacidade.

Nesse sentido há limites para se construir a privacidade em ambientes invasivos onde a ausência de privacidade é a tônica.

Solução pontual e provisória

Então, após vários posicionamentos o paciente se depara com o fato de que a privacidade na sua dinâmica familiar é impraticável. Como esses pacientes resolveram o problema da falta de privacidade em situação de confinamento social?

Algumas estratégias lançadas por pacientes significam soluções pontuais e provisórias para esse problema. Por exemplo, realizar sua sessão de vídeo no quarto, na cozinha, na sala, na varanda, no banheiro, na garagem, dentro do carro, no sótão. A utilização de fones de ouvidos durante a consulta faz parte dessa proteção à intimidade. Mas é fato que nem sempre há um carro disponível ou um quarto separado para o cliente entrar e proteger a sessão. Nesses casos, se o cliente/paciente não possui privacidade para chamada de vídeo, é preciso explorar outros recursos como chamadas de áudio ou mesmo chat.

Ferramentas disponíveis – vídeo, áudio e texto

Aqui, o ponto principal é aprender a selecionar e utilizar a tecnologia necessária para cada caso e situação.

A terapia online por chamada de vídeo é a que mais se aproxima da terapia presencial no consultório, pois o cliente e o psicólogo podem se ver, se ouvir, perceber reações e expressões. Entretanto, essa não é a única ferramenta possível dentro do atendimento online. É possível que as consultas sejam realizadas por chamadas de áudio, texto (chat) ou e-mail.

Quando o cliente/paciente se encontra impossibilitado de construir uma privacidade em sua casa é possível explorar outras ferramentas, como por exemplo sessões por mensagens de áudio, de texto ou chat, capazes de fornecer uma ilha de privacidade dentro do isolamento.

Checklist antes da sua terapia online

  • Escolha ambiente adequado para sua consulta, um local silencioso e sem a presença de outras pessoas.
  • Confira se a câmera e o microfone são de boa qualidade ou se atendem às suas necessidades.
  • Utilize fones de ouvido para melhorar a qualidade do áudio e privacidade.
  • Evite wi-fi público.
  • Verifique a qualidade do sinal de sua internet.
  • Atenção ao aplicativo utilizado, privilegie aqueles que possuem criptografia de ponta a ponta (Google Duo, WhatsApp, etc).
  • Não faça sua consulta em computadores, notebooks, tablets ou smartphones de terceiros.